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O universo da Terapia Familiar reuniu-se no Ispa para abordar formas de ampliar a intervenção sistémica na comunidade

26 de Junho, 2023

O “Fora de Portas” juntou o Ispa, a Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar (SPTF) e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML), num encontro de reflexão sobre a importância da intervenção sistémica na comunidade e do trabalho em rede, na Terapia Familiar.

(da esq. para dir.) Ana Maria Gomes; Ana Jorge, Isabel Leal

O encontro contou com a presença de cerca de 300 psicólogos, terapeutas e outros técnicos, para além de alunos, formadores e formandos, na partilha de conhecimento e de experiências de abertura à comunidade.

O tom foi dado logo na sessão de abertura por Ana Jorge, Provedora da Santa Casa da Misericórdia (SCML), que reiterou ser preciso “abrir as portas e trabalhar com a comunidade”, referindo que é esse o caminho que pretende para a SCML, onde acaba de chegar.

Ana Jorge defende que todos são necessários e “só é possível trabalhar com todos se se trabalhar em rede”, porque, diz: “se não tivermos equipas multidisciplinares não conseguimos ser bons profissionais”.

Isabel Leal, Reitora do Ispa, o instituto que acolheu o evento, disse acreditar “piamente” que só é possível trabalhar bem quando os teóricos e os que investigam estão em contacto com as instituições que têm o contacto direto com as comunidades e com as populações.   

“Esta dinâmica é fundamental. Não acredito no desenvolvimento e na ciência dos processos se não houver esta proximidade. Faz parte da nossa formação a introdução às teorias sistémicas, que são hoje conhecimento básico da formação dos psicólogos”, disse, acrescentando: “O Ispa colabora ativamente na formação e gostaria de colaborar cada vez mais nos projetos comunitários que existem neste país e é isso que ajuda a termos ciência de melhor qualidade, uma intervenção melhor e boas práticas que possibilitem uma vida melhor às pessoas.”

Ana Maria Gomes, presidente da Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar (SPTF) referiu que os laços entre as três instituições são “muito nutritivos”.

“A Terapia Familiar muitas vezes é vista como uma sala fechada e não queremos que seja assim, nunca foi assim. O compromisso de estar aqui é abrir as portas. O modelo sistémico é mais do que terapia familiar; é uma intervenção que permite abrir portas e trabalhar com pessoas em todas as dimensões sociais”, afirmou.

A possibilidade de diferentes pontos de vista

Mariana Pires de Miranda; Madalena Alarcão

No primeiro painel do encontro, “Intervenção Sistémica com as redes”, a Professora da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação (FPCE) da Universidade de Coimbra, Madalena Alarcão, definiu a intervenção sistémica como a possibilidade de olhar para diferentes pontos de vista e para um conjunto de sistemas e subsistemas e ver o que emerge para além deles.

“Ler sistemicamente é um exercício complexo, circular e recursivo (…) Nunca vamos conseguir trabalhar com toda a complexidade, mas a sistémica é importante mesmo que foquemos um só ponto para a compreensão, porque o que faz de nós melhores profissionais é a compreensão”, disse.

Referindo que a intervenção sistémica pode trazer aspetos completamente novos, para além do nosso foco inicial, Madalena Alarcão alertou para o “sistemismo redutor” de olhar apenas para a família, lembrando que é crucial o alargamento da visão para além do sistema familiar.

As múltiplas dinâmicas da Terapia Familiar

(da esq. para a dir.) Joana Sequeira; Ana Gaspar; Bruno Pimentel; Isabel Passarinho; Maria Gouveia Pereira

Num evento muito diversificado, falou-se da importância dos grupos multifamiliares na intervenção com famílias de jovens em acolhimento residencial; dos novos desafios da intervenção em famílias de acolhimento e de intervenções multi-sistémicas nos casos de divórcio, no modelo: “Uma família, duas casas”.

Para além disso, refletiu-se sobre a posição do terapeuta enquanto cidadão, investigador e indivíduo com uma visão do mundo e foram apresentados exemplos de práticas de intervenção com a comunidade como as “Consultas sem Paredes”, do projeto Manicómio; o “Comparte”, da Fundação Maria Rosa; o projeto da Associação Tempo de Mudar, no bairro dos Loios, em Marvila, ou o trabalho desenvolvido pelos Núcleos de Infância e Juventude (NIJ) de Oeiras e da Amadora.

Porque é pelo impacto nas famílias que se mede o sucesso da Terapia Familiar, uma família do Vale da Amoreira emocionou o auditório com a sua história de resiliência e superação dos desafios de vida, num território difícil, com a intervenção de terapeutas familiares.

Formação interinstitucional para os futuros terapeutas

Mariana Pires Miranda, uma das principais impulsionadoras do “Fora de Portas” e organizadora do evento, congratulou-se com a forma como este decorreu: “Foi um momento muito rico. Acho que um encontro corre bem quando pensamos em coisas em que nunca tínhamos pensado e este congresso pôs-me a pensar numa série de coisas. Ver o fundador da Terapia Familiar em Portugal na linha da frente das questões sociais e estarmos a discutir o assunto, acho que é uma marca no pensamento sistémico e na Terapia Familiar e é isso que nos vai fazer conseguir acompanhar as famílias e acompanhar a realidade”.

A professora do Ispa, que pensou o “Fora de Portas” com o objetivo de “criar espaço em que se possam multiplicar os conhecimentos – que estão muito em mosaico – e construir uma espécie de tapeçaria geral que faça sentido e que possa ajudar a repensar a prática terapêutica e também ajudar outros interventores sistémicos”, já começou a ver os primeiros resultados desta reunião de especialistas.

 “Já há conversações específicas de formação interinstitucional, entre a Sociedade de Terapia Familiar, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e o Ispa, para se fazerem módulos específicos direcionados a práticas de intervenção e também troca de sinergias para fazermos estágios académicos de uma forma mais regular, direcionados à intervenção sistémica”, afirmou.

O encontro terminou com uma conversa com Rui Godinho, Diretor da Direção de Infância e Juventude da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e Daniel Sampaio, Psicólogo, Professor Catedrático jubilado e fundador da Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar, que foi um olhar pela Terapia Familiar nas suas múltiplas dimensões: dos desafios do presente aos desafios do futuro, para além de uma verdadeira lição de história, porque não se prepara o futuro da Terapia Familiar, sem conhecer o seu passado.

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